terça-feira, 1 de setembro de 2015

Amor

Tentar amar já é amar.

Aluno

Na mesma rua, à noite, parou em frente ao muro da escola. Voltava sozinho de uma compra no shopping. Momento tranquilo. Fim de domingo, praticamente a única oportunidade de sentir uma cidade mais calma e vazia nos dias atuais.
Ouvia uma velha música dos anos 70, fazendo relembrar passagens de quando estava na escola.
Com seu filho, revive aquela época em que os pais, em frente a um portão semelhante, aguardavam as crianças saírem em alarido frenético, enquanto o sorveteiro era cercado por uma legião ávida por doces.
Hoje não tem sorveteiro. Mas ainda tem porteiro e a mesma febre infantil em busca de novidades.
As crianças saem em disparada, no pátio da escola, brincando de roda, rodando as malas, tropeçando, ouvindo recomendações de cuidado.
Correm de um lado para o outro enquanto o segurança, sim, hoje é necessário, chama uma a uma pelo microfone, assim que chega um responsável para buscá-la.
Em frente àquele portão, no cenário escuro, ele revivia tudo aquilo em sua mente. A lembrança da voz no microfone vinha metálica, parecia ressoar pelos contornos da noite nublada, carregada de mistério.
A árvore dentro da escola balançava com a brisa refrescante, como se acenasse para ele avisando que estava lá, de folga, guardiã à espera da gritaria do dia seguinte.
Os acordes da música o faziam viajar naquele palco conhecido, agora adormecido e vazio. Na frente da porta sempre repleta, o silêncio causou-lhe um misto de estranheza e encanto.
Foi tomado por uma sensação que o levava a vivenciar aquele dia-a-dia agitado. No papel de espectador de si mesmo.
Assistia a um replay de sua rotina, como uma partida de futebol reprisada no final do dia, quando detalhes podem ser melhor percebidos.
O farol da esquina abriu. E desfez o devaneio. Precisava acordar cedo para, dali a poucas horas, voltar ao mesmo local, trazendo o seu filho e retomando o ciclo da correria, no relógio do mundo, na panela que ferve e depois se assenta.
Sentiu-se reconfortado com a experiência e iria utilizá-la quando não pudesse segurar as horas e permanecer se alimentando eternamente daquele frenesi, o mesmo de seus dias de colégio.
Acabara de ganhar um presente: a escola à noite. Em sua nova fase de aluno. Onde, sempre que quisesse, iria para refletir. Para recordar. Para sentir o alarido, compensando o tempo que escorria por suas mãos e que ele não podia segurar.  Foi embora enquanto a árvore, lá do fundo da escuridão, ainda balançava com o vento. Continuava lhe dizendo até amanhã.