terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Sapiens

Toynbee colocou que o homem, ao ter a percepção do consciente, levou milhares de anos, ou até milhões, para fazer alguma coisa. O mesmo homem se ilude achando que o imediatismo da sociedade contemporânea o levará a algum lugar.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Aposentado

Já estava aposentado havia muito tempo. Tinha 80 anos, era bem de vida. E decidiu fazer terapia. Queria ajudar na recuperação de um filho. Foi uma maneira de ser humilde. “Onde foi que errei?” Foi uma maneira de se perdoar. “Será mesmo que errei?” Foi uma maneira de ser forte. “No que posso melhorar?” Foi, acima de tudo, uma maneira de dizer. “Estou com você, meu filho.”

Entrevistas

Um entrevistador, em geral, joga no outro a responsabilidade de passar em uma entrevista de emprego. Abre mão de interpretar a alma alheia. Acomoda-se em apenas se basear na primeira impressão. E, a capacidade de, com o tempo, o entrevistado se soltar e, impulsionado por um ambiente acolhedor, se tornar uma contratação excepcional? “Tempo?” “Mas que bobagem é o tempo!”, pensa o entrevistador. O importante para ele é o momento, quantas vezes o outro desviou o olhar, algo que, segundo normas rígidas, expressa uma estranha falta de segurança. Está em voga a pouca tolerância para falhas aparentes, gestos fora de moda, idealismos, ansiedades naturais. Se estes aparentam falta de firmeza e de assertividade, podem mostrar por outro lado honestidade. E abrem possibilidades para um mundo criativo, puro. Muitos entrevistadores hoje em dia são jovens inexperientes, que também lutam por um lugar ao sol. Há, porém, uma ilusão em torno dos truques de convencimento. Há uma busca obsessiva pelo marketing pessoal. Há um olhar distorcido que supervaloriza as regrinhas de apresentação e as técnicas de almanaque. Há uma indústria da artificialidade que banaliza a essência humana. Uma palavra mal encaixada, um time de coração diferente ou uma preferência pessoal podem frustrar expectativas de uma vida. “Fale isto, não diga aquilo”. “Seja assim, não seja assado”. “Faça e aconteça”. Em outras palavras, estas frases expressam indiferença ao indivíduo. E exclamam: “esconda-se de si mesmo”. Em uma sociedade cheia de fingimentos, fica difícil alguém passar em uma entrevista. A não ser que ele seja quem não é. Mas não tem jeito. Mais cedo ou mais tarde o verdadeiro eu vai aparecer. E sem precisar ser entrevistado.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Banqueiro

Ele era banqueiro. Acompanhava suas finanças, na tela do computador, nos esticados números da conta. Escolhia operações com frieza matemática. E se projetava no engenheiro, no médico, no publicitário de sua turma no científico. Todos homens de sucesso, do concreto. Naqueles padrões, alguém que falasse de ética, da importância de ser honesto seria considerado louco. Um excluído, um perdedor. Na frieza de seus gestos, nos seus e-mails monossilábicos, pelas propostas que recebia e por causa das festas das quais participava, podia-se dizer que ele era um vencedor. Era assim que o viam. Mas, bem no fundo, não era assim que ele se sentia.