sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Nelson

Rever "Água Viva" é voltar no tempo. A abertura com a música 'Menino do Rio" diz muito sobre a cidade nos anos 80. Observamos as paisagens, os semblantes, os carros e sentimos o imediatismo, os sonhos de grandeza e a sensualidade provocante daquele tempo como algo ingênuo e doce. No fundo, os participantes e as cenas eram mais humanas, mais contínuas. Assistir hoje cada capítulo, na reprise da trama que o Canal Viva colocou no ar, é um exercício de paciência, se o compararmos ao frenesi dos folhetins atuais. Os diálogos e as lembranças são longas. A complexidade dos personagens é  maior, eles atuam em um ritmo mais cadenciado. Pegue-se o ex-playboy Nelson Fragonard. Como protagonista, viveu um processo de amadurecimento na história. Ele se mostra um homem em conflito, lutando contra o seu orgulho infantil que o impediu de ir mais além nas relações e em sua vida profissional. Bonita evolução, cheia de reflexão, situação similar às de outros personagens. Basta lembrar a relação problemática de Marcos com a mãe, tão esmiuçada e analisada. As novelas, depois, começaram a ganhar uma agressividade distorcida. Que chega a ferir de indignação por meio de seus vilões sanguinários, egoístas, materialistas, tão admirados por uma grande parcela da audiência. Novela, no fundo, é um retrato do momento da sociedade. As novelas, em parte, enlouqueceram. Isso mostra que a população também.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Existências

Meu filho fez cinco anos. Como é que eu tenho 44 se eu não existia antes dele?

Paternidades

Padrasto do enteado e pai do filho são pleonasmos na gramática. No mundo da emoção, porém, têm o mesmo significado: amor e confiança.

Silêncios

Um astronauta flutua no silêncio da gravidade. Quem nasceu antes, o universo ou o silêncio? Silêncio ambíguo que angustia na ausência da resposta. Ele pode camuflar a reprovação ou a aprovação. Leva o verbo ao brilho do olhar, ao sentido do gesto, ao sorriso sem palavras, aberto ou circunspecto. O astronauta vê o mundo e se afaga na tranquilidade sideral. Mas naquelas paragens gravitacionais o silêncio também é perigoso. De seu manto traiçoeiro, cometas atravessam o espaço num ímpeto voraz que destrói o que vê pela frente, ultrapassando a barreira do som, espatifando a abóbada emudecida e passiva. O silêncio também é passivo. Indica medo, ameaça, terror. Mas no semblante da criança alegre ele traz uma mensagem de esperança. O silêncio é amor na entrega de uma flor. Precede o choro do nascimento, o primeiro canto dos pássaros da manhã. Envolve os amantes deitados depois do sexo, pensando na vida, olhando para o teto. Silêncio indica confiança, de seu ventre emana a paciência. Não há sabedoria sem silêncio. Mas ele também emerge das trevas e nele mergulha o ato da morte. Serve de hiato até o primeiro grito após uma explosão. Não há cemitério sem silêncio. Mas não há nada mais belo do que uma noite estrelada e silenciosa. Também não há leitura sem silêncio. Se for de Poe, ele é cortado por um arrepio. Se for de Millor por uma risada. Se for de Proust, por um suspiro. O silêncio pode ser inadequado e verdadeiro, como o gauche de Drummond. Enfeitiçado como a mágica de Paulo Coelho. Irritante na postura do psicanalista. Racional ou emotivo. As possibilidades do silêncio são infinitas. Vivemos em um mundo em que nos projetamos nas respostas. A era do feed back. Quando elas não vêm em forma de palavras elogiosas, perdemos o rumo. E perdemos oportunidades, como suicidas que se precipitam com informações falsas. Desistimos pensando que fomos enganados pelo silêncio. Na verdade fomos enganados por nós mesmos. Por nosso caos interior, barulhento e impaciente. Que não esperou para entender uma admiração não declarada. Ou não percebeu o gesto de amizade contido. Porque silêncio nenhum sobrevive sem uma pitada de amanhã. O silêncio, afinal, se revela no tempo. 

Fígado

As palavras de Seedorf vieram de seu fígado. Alguma rixa de jogo. Afinal, Ganso jogaria na Europa. Seedorf é que não teria lugar na seleção brasileira.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Irados

Quando um motorista é fechado no trânsito, ele fica irritado e xinga pensando se referir a quem o fechou. Na verdade, ele está xingando a sua própria irritação.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Felizes

Felicidade é um conjunto de pequenas infelicidades com as quais aprendemos a conviver bem no dia-a-dia.

domingo, 3 de novembro de 2013

Canto

Um olhar que encanta, a tristeza ele espanta. Um sorriso levanta. Mesmo que não saiba, se firma como uma planta. E quem sua luz toca, não tem jeito: a vida canta.

Maldades

Dormiu mal. Acordou mal. Entendeu mal. Reagiu mal. Escutou mal. Respondeu mal. Dançou mal. Jogou mal. Explicou mal. Expressou-se mal. Chegou mal. Deixou mal. Saiu-se mal. Leu mal. Fez mal. Casou-se mal. Viveu mal. Há palavras que vão além do normal. Hipnotizam as outras, como esse tal de mal. Não importa o que seja, tudo com elas fica igual.