terça-feira, 26 de novembro de 2013

Silêncios

Um astronauta flutua no silêncio da gravidade. Quem nasceu antes, o universo ou o silêncio? Silêncio ambíguo que angustia na ausência da resposta. Ele pode camuflar a reprovação ou a aprovação. Leva o verbo ao brilho do olhar, ao sentido do gesto, ao sorriso sem palavras, aberto ou circunspecto. O astronauta vê o mundo e se afaga na tranquilidade sideral. Mas naquelas paragens gravitacionais o silêncio também é perigoso. De seu manto traiçoeiro, cometas atravessam o espaço num ímpeto voraz que destrói o que vê pela frente, ultrapassando a barreira do som, espatifando a abóbada emudecida e passiva. O silêncio também é passivo. Indica medo, ameaça, terror. Mas no semblante da criança alegre ele traz uma mensagem de esperança. O silêncio é amor na entrega de uma flor. Precede o choro do nascimento, o primeiro canto dos pássaros da manhã. Envolve os amantes deitados depois do sexo, pensando na vida, olhando para o teto. Silêncio indica confiança, de seu ventre emana a paciência. Não há sabedoria sem silêncio. Mas ele também emerge das trevas e nele mergulha o ato da morte. Serve de hiato até o primeiro grito após uma explosão. Não há cemitério sem silêncio. Mas não há nada mais belo do que uma noite estrelada e silenciosa. Também não há leitura sem silêncio. Se for de Poe, ele é cortado por um arrepio. Se for de Millor por uma risada. Se for de Proust, por um suspiro. O silêncio pode ser inadequado e verdadeiro, como o gauche de Drummond. Enfeitiçado como a mágica de Paulo Coelho. Irritante na postura do psicanalista. Racional ou emotivo. As possibilidades do silêncio são infinitas. Vivemos em um mundo em que nos projetamos nas respostas. A era do feed back. Quando elas não vêm em forma de palavras elogiosas, perdemos o rumo. E perdemos oportunidades, como suicidas que se precipitam com informações falsas. Desistimos pensando que fomos enganados pelo silêncio. Na verdade fomos enganados por nós mesmos. Por nosso caos interior, barulhento e impaciente. Que não esperou para entender uma admiração não declarada. Ou não percebeu o gesto de amizade contido. Porque silêncio nenhum sobrevive sem uma pitada de amanhã. O silêncio, afinal, se revela no tempo. 

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