terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Escuros

A escuridão controlada é diferente daquela que o ameaçava antigamente. Quando a luz acabava, na sua casa, era como se ele caísse no abismo. Uma sensação de descontrole o rondava, alimentada pelo silêncio que pairava na atmosfera sem luz. Sua mãe acendia velas e o reflexo das chamas fazia a silhueta de cada um se transformar em sombra monstruosa tremeluzindo na parede. Era como se a casa estivesse habitada por fantasmas que, apesar de existirem, não apareciam no dia-a-dia. O lado sombrio do ser humano emergia no escuro, quando a luz faltava repentinamente. Agora, estar no controle da escuridão é outra coisa. Dá a sensação de que este lado viscoso e traiçoeiro finalmente está em nossas mãos. É bom ficar no quarto, com a luz apagada, sonhando com músicas do passado, se perdendo na imensidão imaginária que o escuro traz. Ou olhar para o céu noturno e viajar por suas estrelas, amparado pelo cheiro de brisa e o toque da lua. Até o céu cinzento e misterioso é acolhedor, sugerindo um fundo de luz por trás de seu manto diáfano. Nestas situações há o controle do homem, que pode entrar em casa, acender a luz ou simplesmente dormir. E enquanto ele está diante desta escuridão acolhedora, sua sombra arrefece, dá trégua. Fica parecendo que o escuro é um enorme útero e que o céu, tal qual o nome do filme, nos protege. Se esta noite fosse eterna, seria uma solução tranquilizante. Não haveria um breu ameaçador. Só os bons pensamentos viriam para fortalecer, com projeções românticas no teto ou no firmamento. Seriam desenhos de nossa auto-estima, nossa criatividade, lado mais nobre que nos conduz e que não conseguimos mostrar, à luz de nossos conflitos internos.

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