quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Criaturas

Filho que tem raiva do pai, político que rompe com seu mentor, jogador que derruba o técnico que o promoveu. Psicóloga da esposa, indicada pelo marido, que alimenta a discórdia do casal. A história de Frankenstein, de Mary Shelley, se repete aos montes. É a criatura se tornando monstruosa e se voltando contra seu criador. Ingratidão? Vingança? Pode ser também a sanha competitiva do ser humano a aflorar desenfreadamente na tentativa de extinguir a própria origem, se esquecer da fragilidade inicial. Mas a fraqueza se mantém, escondida, apesar da ilusão da onipotência. Há uma passagem bíbilica que diz do pó vieste e ao pó voltarás. Quando odiamos a fagulha que nos originou, pode haver algo errado. O sopro tomou ares de tempestade. As faces do criador se tornam incômodas, espelhos de nossa própria condição humana. E, ao invés de agradecermos pela força criativa que nos fez, fremimos nossa fúria contra ela, anestesiamos a dor do parto diário que é viver. E perdemos a beleza de termos sido criados à sua imagem e semelhança.

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