quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Efeminado

Um dia, ele começou a se sentir pouco à vontade para escrever sobre futebol. Algo vazio prevalecia em seus sentimentos cada vez que ele elogiava um gol, admirava um jogador, comparava o jogo com arte. Sentia-se envolvido em uma balela, repetindo um discurso padronizado. Jogo é jogo, arte é arte. O futebol costuma tornar o homem mais rude. A arte não. Um poeta que fala sobre futebol não deve se surpreender se for considerado efeminado por torcedores e jornalistas. Poucos percebem que não se transforma algo em arte apenas com o discurso. O personagem principal de Proust, admirador do escritor Bergotte, viu-se decepcionado com a presença física do mesmo em um jantar, porque não adianta estar perto de um escritor famoso, observar seus gestos, a maneira que ele segura os talheres ou seus diferentes semblantes, para escrever bem. Na relação entre futebol e arte, vale o mesmo. Florença é o berço da arte renascentista. Na Galeria de Uffizi estão expostas obras de Leonardo da Vinci, Botticelli, Rafael, Rubens, Tiziano e Michelangelo. O local é um palácio estruturado em pilares da Renascença. Na arquitetura, a cidade é recheada de arcos curvilíneos, colunas com capitéis coríntios, harmonizando-se com as casas perfiladas em ruas estreitas. Lá nasceu Dante Alighieri. Os campos e os montes fiorentinos respiram história e beleza que traduzem os conflitos mais profundos do homem. Nem por isso o clube local, a Fiorentina, deixa de ter os mesmos vícios do futebol. Nem por isso, em uma disputa de bola, seus jogadores reproduzem o olhar contemplativo de da Vinci, a postura humilde e reta de Donatello ou o semblante compadecido de Giotto. A arte não prima por ser competitiva. O futebol arte, portanto, é apenas uma expressão. O futebol arte, afinal, não existe nem em Florença.

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