quarta-feira, 21 de julho de 2010

Magnética

Nunca imaginara entrar em um aparelho de ressonância magnética. Seu coração batia acelerado, já na maca. Com o rosto preso a um protetor facial, olhou para trás e pensou em gritar de pânico. Conteve-se. Entrou no tubo, parecido a uma cápsula espacial imersa em uma sala branca. Temeu por sua claustrofobia. Mas foi se descobrindo mais forte do que ela. Os barulhos ensurdecedores não o venciam. Nem mesmo aquele de britadeira em alta potência bem ao seu ouvido. Ou aquele que parecia o de um homem fúnebre repetindo frases distorcidas, em inglês. “Go on, go on, go on...” Aos poucos, a ânsia em fugir dali deu espaço ao desejo de sair logo dali, mas vitorioso. Decidiu não se render a seus temores, atiçados pelo aparelho que bem poderia ser usado por torturadores nos regimes ditatoriais. E pensou: se venço esses sons concretos, por que não posso superar meus rugidos internos, fantasiosos? Foi como uma sessão de análise, mais dura.
Ao sair, satisfeito, parecia ter encerrado extenuante viagem, tonto e enjoado que ficou o resto da noite. No dia seguinte, no café do hospital, leu na bíblia todo o regozijo divino após ter criado o céu, a terra, os mares, os répteis, as aves, os peixes e os outros animais, sequência concluída com a moldagem do homem e da mulher. Também foram tempos de barulhos ensurdecedores: tremores, ruídos da terra se abrindo, chiados da água açoitando a pedra, o doloroso rompimento da luz com a escuridão. O criador mesmo sabia que mudanças doem. Pode até ter ficado satisfeito quando Adão e Eva cederam à tentação da serpente. Só assim puderam se multiplicar e criar ramificações. Chegou a dizer, “agora eles são como nós, conhecedores do bem e do mal...” E descansou no sétimo dia, santificando uma missão cumprida, a ressonância magnética inicial.

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