quarta-feira, 12 de maio de 2010

Dentinhos

Aproximei-me do Secretário, um homem jovem, robusto e de óculos, para lhe dar o convite do lançamento do meu livro. Após ouvir os cumprimentos, um tanto automatizados pela função de ter de agradar a todos, ouvi uma frase conhecida. "Livro é como um filho, não"? Forçado a conveniências sociais, também enveredei pelo campo do artificialismo e respondi de pronto. "É, claro, é como um filho". Depois, sozinho, longe dos holofotes do saguão onde o encontrara, pude refletir sobre o dito de meu interlocutor. "Livro é como um filho". Entrei em casa, fui ao quarto do meu menino e o vi dormindo no berço, olhinhos fechados, imaginando apenas seus sorrisos diários expondo os dentinhos que, como ele, acabaram de nascer.
E senti algo muito mais intenso e altruísta do que sinto por meus escritos. Amar um filho é algo, ao mesmo tempo palpável, que dói no corpo, e transcedental, que mexe com a alma. O apego a um livro é mais egoísta, uma espécie de desabafo criativo, uma transformação das próprias fraquezas expurgando-as e se purificando. Inicialmente, é bom apenas para seu autor. Se gostarem ou não, pouco importa. O destino do meu filho, no entanto, certamente influirá no destino de minha vida. De minhas palavras, dos meus livros. Só aceito a comparação entre filho e livro sob um enfoque. O de que o meu filho foi o livro mais lindo que eu já escrevi.

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