segunda-feira, 5 de abril de 2010

Contornos

Escurece em Santo André.
Luzes pingam em vários pontos.
Nas lâmpadas das praças, nos prédios bem longínquos.
Outras se apagam, no fim do expediente, na Câmara Municipal.
O Fórum já fechou, silêncio de fora vem aumentando, englobando o Fórum, as ruas, as esquinas quase vazias.
Vozes ainda no departamento falam de política do concreto esquecido no dia seguinte. “Vou marcar para amanhã a reunião, que horas?”
Sons distantes de ônibus freando trazem uma sensação de liberdade, paz que se mistura ao som da chuva leve namorando o vento. Trovõezinhos sussurram como a percussão suave da orquestra.
Vento da noite, movimenta nuvens que vão tingindo o céu cinzento, desembocando no preto.
Da janela ele olha para trás dos prédios, não vê, imagina, e sua vista desliza para além do último para-raio vermelho.
Onde as montanhas se fazem serra, etapa derradeira rumo ao mar.
O teclado da menina ao lado soa emburrado.
Mas ele resiste à limitação estética da aparência.
Ele trabalha, sim, e muito.
Faz poesias na política de Santo André, pela escuridão que vai caindo, desfazendo mais um entardecer.
Escreve linhas olhando as árvores do Paço, onde está o seu espaço? Noite azul escura, cinzenta, abstrata.
Mergulha no cenário e trabalha. Vê sua imagem refletida no vidro com o fundo negro lá de fora. Parece sério, seu semblante ainda estampa tristeza.
Mas ele já sorri para o breu, que agora só traz o contorno desigual dos prédios. O breu sugere. Ele segue. Encontra o passo, espaço no Paço.
Trabalha o verso. Passeia pelas palavras, as esculpe, tateia aqui e ali, vai seguindo no caminho, transportado por luzes que pingam em seu interior, pela noite.

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